Por Vladimir Neiva, Presidente do Grupo Neiva Educação
Uma revolução silenciosa, porém poderosa, está em curso no Brasil. Longe dos holofotes das discussões sobre carros autônomos e assistentes virtuais, a Inteligência Artificial (IA) está sendo tecida na estrutura dos nossos serviços públicos mais essenciais: a educação e a saúde. Com um investimento governamental de R$ 23 bilhões previsto até 2028 no Plano Brasileiro de Inteligência Artificial [1], estamos diante de um momento histórico. Como CEO de uma empresa dedicada a moldar o futuro da educação, vejo nesta transformação não apenas um avanço tecnológico, mas uma oportunidade sem precedentes de redefinir o potencial humano e o desenvolvimento social do nosso país.
A Educação na Vanguarda
Enquanto muitos ainda debatem o papel da IA na sala de aula, os dados mostram que o Brasil já assumiu uma posição de liderança. Uma pesquisa recente da OCDE revelou que 56% dos professores brasileiros já utilizam ferramentas de IA, um número significativamente superior à média de 36% dos países da organização [2]. Nossos educadores não estão esperando pelo futuro; eles o estão construindo agora, usando a tecnologia para gerar planos de aula, personalizar o aprendizado e otimizar seu tempo.
Essa adoção não se restringe aos professores. Cerca de 70% dos alunos do ensino médio já integram a IA em suas rotinas de estudo [3]. Essa realidade nos coloca, como líderes do setor educacional, em uma posição de imensa responsabilidade e oportunidade. A experiência pioneira do Piauí, que tornou a IA uma disciplina obrigatória no ensino médio [1], não é um caso isolado, mas um modelo a ser observado e replicado. A demanda por capacitação é evidente, e é nosso dever como
empresas de educação preencher essa lacuna, transformando a curiosidade em competência e a ferramenta em solução pedagógica.
Lições da Saúde: Onde a IA Já Salva Vidas e Otimiza Recursos
Se a educação é o cérebro da transformação digital, a saúde é o seu coração pulsante. E os resultados já são visíveis. Hospitais públicos, que formam a espinha dorsal do nosso sistema de saúde, estão demonstrando o poder da IA na prática.
O Hospital Geral do Grajaú, em São Paulo, caminha para ser uma instituição 100% digital, eliminando a burocracia e agilizando o atendimento [4]. O Hcor, por meio de um programa que atende mais de 700 unidades do SUS, utiliza IA para laudar 15 mil eletrocardiogramas por mês, com diagnósticos que chegam em até 10 minutos e salvam vidas ao priorizar casos de infarto [4]. Na Santa Casa de Belo Horizonte, uma IA para auditoria de prescrições gerou uma economia de R$ 1,3 milhão em um ano, recurso que foi reinvestido no tratamento de mais pacientes [4].
Esses exemplos são mais do que inspiradores; são a prova de que a digitalização e a automação inteligente não são luxos, mas sim ferramentas essenciais para a sustentabilidade e eficiência do setor público. A lição para nós, da educação, é clara: se a IA pode otimizar o cuidado em situações críticas, seu potencial para revolucionar a jornada de aprendizagem é igualmente vasto.
A Convergência Estratégica: O que a Saúde Ensina à Educação
Ao analisar os avanços e desafios em ambos os setores, percebemos uma notável convergência. Tanto a saúde quanto a educação enfrentam obstáculos semelhantes: a necessidade urgente de digitalizar processos, a falta de capacitação profissional, as profundas desigualdades estruturais e as complexas questões éticas sobre privacidade e viés algorítmico [5].
Essa sobreposição de desafios nos oferece uma oportunidade única para uma abordagem holística. O primeiro passo, como demonstrado pelo setor de saúde, é a digitalização. Um prontuário eletrônico unificado é o equivalente a uma plataforma de
gestão de aprendizagem integrada. A partir dessa base de dados robusta, a IA pode começar a operar sua mágica, seja prevendo surtos de dengue ou identificando alunos em risco de evasão escolar.
Como CEO de uma empresa de educação, entendo que nosso papel transcende a sala de aula. Somos os principais habilitadores de toda a transformação digital do país. Sem profissionais qualificados, nem a saúde, nem a indústria, nem a gestão pública conseguirão implementar a IA de forma eficaz e responsável.
Navegando os Desafios com uma Visão de Futuro
O caminho à frente não é isento de riscos. O viés algorítmico pode perpetuar e até ampliar as desigualdades que lutamos para combater. A privacidade dos dados de alunos e pacientes é um pilar inegociável. A falta de infraestrutura em muitas regiões do país é uma realidade que não pode ser ignorada.
Nossa resposta a esses desafios definirá o sucesso desta jornada. A solução não está em frear a inovação, mas em guiá-la com sabedoria e responsabilidade. Isso exige a criação de comitês de ética, a promoção de parcerias público-privadas focadas em impacto social e um compromisso inabalável com a transparência. O objetivo final não é substituir o professor ou o médico, mas sim amplificar suas capacidades, liberando
os de tarefas repetitivas para que possam se dedicar ao que a tecnologia jamais poderá substituir: o cuidado, a empatia e a conexão humana.
O Futuro é Humano, Amplificado pela Inteligência Artificial
O Brasil tem a chance de não apenas consumir tecnologia, mas de se tornar uma referência global na aplicação ética e eficaz da Inteligência Artificial em serviços públicos. Para nós, líderes do setor educacional, este é um chamado à ação. Devemos abraçar a mudança, investir na capacitação de nossos educadores e desenvolver soluções que sejam acessíveis, escaláveis e, acima de tudo, humanas.
A revolução silenciosa da IA já começou. Cabe a nós garantir que sua voz seja a da inclusão, da eficiência e do progresso para todos os brasileiros. O futuro não será uma
disputa entre homens e máquinas, mas uma sinfonia onde a inteligência humana é amplificada pela inteligência artificial, criando uma sociedade mais justa, saudável e educada.
Referências
[1] Agência Senado. (2025, 22 de outubro). Em debate, governo prevê amplo uso de IA na saúde e na educação até 2028. Senado Notícias. https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2025/10/22/em-debate-governo preve-amplo-uso-de-ia-na-saude-e-na-educacao-ate-2028
[2] Agência Brasil. (2025, 6 de outubro). Professores no Brasil usam mais IA que média dos países da OCDE. https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2025- 10/professores-no-brasil-usam-mais-ia-que-media-dos-paises-da-ocde
[3] Cetic.br. (2025, 16 de setembro). Sete em cada dez alunos do Ensino Médio usam IA generativa em pesquisas escolares, revela TIC Educação. https://cetic.br/noticia/sete em-cada-dez-alunos-do-ensino-medio-usam-ia-generativa-em-pesquisas-escolares revela-tic-educacao/
[4] Varella, D. (2024, 24 de setembro). Inteligência artificial na saúde pública: o que os hospitais do SUS já estão usando?. Portal Drauzio Varella. https://drauziovarella.uol.com.br/saude-publica/inteligencia-artificial-na-saude publica-o-que-os-hospitais-do-sus-ja-estao-usando/
[5] Picanço, M., Vieira, P., & Castello, G. (2025, 7 de abril). Os desafios da inteligência artificial no setor de saúde brasileiro. Nexo Políticas Públicas. https://pp.nexojornal.com.br/opiniao/2025/04/07/os-desafios-da-inteligencia artificial-no-setor-de-saude-brasileiro/
