Introdução
Vivemos em uma era paradoxal. A conectividade global, que prometia democratizar o acesso ao conhecimento e fortalecer laços sociais, tornou-se também um terreno fértil para a proliferação de um fenômeno insidioso: a desinformação digital. Este artigo busca aprofundar a discussão sobre a velocidade e o impacto da mentira no ambiente online, partindo da premissa de que, como bem aponta o artigo de Alek Maracajá, “a mentira digital viaja mais rápido que a verdade” [1]. Minha posição é clara: a desinformação não é apenas um problema tecnológico, mas uma crise multifacetada que exige uma resposta coletiva e urgente, sob pena de erodir as bases da nossa sociedade democrática.
A Velocidade Incontrolável da Mentira
O artigo de referência destaca um dado alarmante: enquanto uma postagem verdadeira alcança cerca de 1.000 pessoas, uma fake news pode atingir de mil a 100 mil usuários em poucas horas [1]. Essa disparidade não é acidental. A mentira é frequentemente construída para ser apelativa, para ativar emoções primárias como medo, indignação ou esperança, e os algoritmos das redes sociais, por sua natureza, tendem a amplificar conteúdos que geram maior engajamento, independentemente de sua veracidade. Em um “oceano de dados” onde 2,5 quintilhões de bytes são gerados diariamente, discernir o real do fabricado torna-se uma tarefa hercúlea [1].
Impactos Profundos na Sociedade
Os efeitos da desinformação transcendem o mero engano individual. As pesquisas complementares revelam que a desinformação é considerada o principal risco global para 2025 [2], superando até mesmo as mudanças climáticas em termos de preocupação imediata. No Brasil, sete em cada dez pessoas temem não conseguir diferenciar uma notícia verdadeira de uma falsa [1].
Os impactos são vastos e preocupantes:
•Saúde Pública: Durante a pandemia de COVID-19, a desinformação sobre tratamentos e vacinas causou danos irreparáveis, minando a confiança em instituições de saúde e colocando vidas em risco [3].
•Processos Democráticos: As fake news políticas podem manipular a opinião pública, influenciar eleições e polarizar a sociedade, como evidenciado por estudos sobre cascatas de desinformação em plataformas como o Twitter [4].
•Economia e Reputação: Empresas e indivíduos podem sofrer prejuízos financeiros e danos à reputação devido à disseminação de informações falsas [5].
•Coesão Social: A desinformação alimenta preconceitos, estereótipos e divisões, dificultando o diálogo construtivo e a busca por soluções coletivas para problemas complexos.
Minha Posição: Um Chamado à Ação Coletiva
Diante desse cenário, é imperativo que a sociedade adote uma postura proativa. Não podemos nos dar ao luxo de sermos meros espectadores da erosão da verdade. Minha visão é que o combate à desinformação deve ser multifacetado, envolvendo:
1.Alfabetização Midiática e Digital: Fortalecer a capacidade crítica dos cidadãos para analisar e questionar o conteúdo que consomem e compartilham. Isso deve começar nas escolas e se estender por toda a vida, capacitando as pessoas a reconhecerem padrões de desinformação e a buscarem fontes confiáveis [6].
2.Responsabilidade das Plataformas: As grandes empresas de tecnologia precisam ir além da mera moderação de conteúdo. Devem investir em inteligência artificial para identificar e combater redes coordenadas de desinformação em tempo real, além de rever seus algoritmos para priorizar a veracidade sobre o engajamento a qualquer custo [1, 7].
3.Políticas Públicas Robustas: Governos e órgãos reguladores têm um papel crucial na criação de marcos legais que coíbam a disseminação intencional de desinformação, sem, contudo, cercear a liberdade de expressão. Iniciativas como as da União Europeia no combate à manipulação da informação são exemplos a serem observados [8].
4.Jornalismo de Qualidade e Verificação de Fatos: O fortalecimento do jornalismo profissional e independente, com foco na apuração rigorosa e na checagem de fatos, é um pilar essencial. O apoio a iniciativas de fact-checking é vital para contrapor as narrativas falsas com informações baseadas em evidências.
Conclusão
O desafio de impedir que a mentira digital viaje mais rápido que a verdade é, de fato, o desafio do nosso tempo [1]. A desinformação não é um problema que se resolverá sozinho; exige uma mobilização sem precedentes de tecnologia, educação, legislação e, acima de tudo, uma consciência coletiva sobre o valor inestimável da verdade. Somente assim poderemos garantir que o ambiente digital seja um espaço de enriquecimento e não de manipulação, preservando a integridade da informação e a saúde da nossa democracia.
Referências
[1] Maracajá, A. (2025). A mentira digital viaja mais rápido que a verdade. Administradores.com. Disponível em: https://www.administradores.com.br/artigos/a-mentira-digital-viaja-mais-rapido-que-a-verdade
[2] Agência Brasil. (2025, 20 de maio). Desinformação é principal risco global para 2025, afirma relatório. Disponível em:
[3] Ferreira, J. R. S., Lima, P. R. S., & Souza, E. D. (2021). Desinformação, infodemia e caos social: impactos negativos das fake news no cenário da COVID-19. Em Questão, 27(2), 274-297. Disponível em: https://www.repositorio.ufal.br/handle/123456789/13919
[4] Recuero, R., & Gruzd, A. (2019). Cascatas de Fake News Políticas: um estudo de caso no Twitter. Galáxia (São Paulo), (42), 123-138. Disponível em: https://www.scielo.br/j/gal/a/Kvxg4btPzLYdxXk77rGrmJS/?lang=pt
[5] Unibrasil. (2025, 30 de janeiro). Qual o impacto que a divulgação de notícias falsas causa em redes sociais?. Disponível em: https://www.unibrasil.com.br/qual-o-impacto-que-a-divulgacao-de-noticias-falsas-causa-em-redes-sociais/
[6] Ançanello, J. V., Casarin, H. C. S., & Furnival, A. C. (2023). Competência em Informação, fake news e desinformação: análise das pesquisas no contexto brasileiro. Em Questão, 29(2), 1-22. Disponível em: https://www.scielo.br/j/emquestao/a/n3kHjFtrWV6gBWKjfJnFCGz/?format=html
[7] IBICT. (2025, 18 de julho). Desinformação, redes sociais e o papel da comunicação pública da ciência. Disponível em: https://www.gov.br/ibict/pt-br/central-de-conteudos/noticias/2025/julho/desinformacao-redes-sociais-e-o-papel-da-comunicacao-publica-da-ciencia